Diário de Gênero: Dia Internacional de Combate às LGBTfobias

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No início de 2006 eu ainda era mestrando na Fundação Universidade Federal do Rio Grande (FURG), localizada no extremo sul brasileiro, na região dos Pampas. Recebi um e-mail em que Louis-George Tin, ativista gay e negro franco-martiniquês, convocava as organizações LGBT de todo o mundo para nos unificarmos em torno da construção do dia 17 de Maio como o Dia Mundial contra a Homofobia, Lesbofobia e Transfobia.

Naquela época celebrávamos apenas o Dia do Orgulho e o argumento central para a adesão à data era a necessidade de focarmos enquanto sociedade no combate à violência a que são submetidas lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros. Em parceria com instituições dos movimentos sociais de Rio Grande, município do interior gaúcho, iniciamos o advocacy para a aprovação da data no calendário oficial da cidade. No dia 27 de Junho de 2006 a lei foi publicada e até o presente atividades são organizadas no município em alusão à essa data. Foi a primeira lei que instituiu a data em um calendário oficial em nosso país. O Decreto de Lula, que instituiu o dia 17 de Maio no calendário nacional, veio em 2010.

Como facilmente encontramos no Google, no dia 17 de Maio de 1990 a homossexualidade deixou de ser considerada uma doença pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e por isso foi eleita como data para visibilizarmos as ações de combate à violência LGBTfóbica em nossa sociedade.

Em 2017, 11 anos após a aprovação dessa lei, que nos resta?

Sou um homem gay de 35 anos, professor universitário. Apesar de não parecer superei muitos obstáculos homofóbicos para me tornar acadêmico, dentre eles não ser considerado “racional” o suficiente para o mundo da ciência. Nesse sentido já enfrentei muita homofobia na minha vida e, como gosto de dizer, sou constituído também pela discriminação e preconceito cotidianos que sofri. E ainda não acabou. Todos os dias é difícil saber se enfrentarei olhares maliciosos, discriminações no trabalho, na família, nos círculos de amizade. Segundo o relatório do GGB de assassinatos de homossexuais a segunda categoria profissional de gays mais assassinada são os professores. Além desse medo constante enfrentamos desautorizações cotidianas por parte de colegas, alunos, profissionais os mais variados pois, em nossa sociedade, um gay não é visto como “uma autoridade”. Pessoas heterossexuais na mesma posição que eu nunca sofreriam os tipos de assédio que sofro.

Sou vítima da homofobia. Isso não é se vitimizar. É entender que os valores e crenças de nossa sociedade são guiados pelas heterossexualidade, ou melhor, pela norma heterossexual. Na heterossexualidade estão todos os bons valores a serem cultivados. Na homossexualidade estamos sempre a um passo atrás. Entretanto somos uma população inventiva, criativa e contribuímos muito com a sociedade. Somos ótimos filhos e netos. Excelentes pais. Professores preocupados com a situação de nossos alunos e também com o seu futuro profissional. Nos afetamos com as situações da vida. Produzimos arte!

Se foquei até aqui na violência a que estou submetido cotidianamente devo também afirmar que não estou sozinho. Somos milhões de pessoas LGBTQ submetidas a todas as formas de violência imagináveis e inimagináveis! As violências contra nossas populações variam muito, de olhares maliciosos ao assassinato. Por isso continuarei na luta, enfrentando todos os obstáculos que aparecerem na minha frente e aberto ao diálogo com todas e todos lutadoras e lutadores sociais comprometidas com a transformação social em nosso país. Nossa revolução está em curso e não será de fato enquanto o exercício de sexualidades não heterossexuais for considerado um desvio. O importante é não perdermos o bom humor, tampouco a alegria de viver.

Nessa semana do dia 17 de Maio valorize suas amigas e amigos lésbicas, gays e trans. Dê um abraço, seja solidário. Diga que está ao seu lado. Apoie sua amiga que é mãe de uma pessoa LGBT. Não zombe de um pai ou irmão de uma pessoa LGBT. O Brasil pode ser um país melhor para todas e todos nós e para isso nossa principal tarefa é, como afirmava Nilcéa Freire quando estava à frente da Secretaria de Mulheres do governo Lula, “seduzir corações e mentes”.

Texto: Prof. Dr. Felipe Bruno Martins Fernandes | Professor do Bacharelado em Estudos de Gênero e Diversidade da UFBA e Coordenador do GIRA.

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