Diário de Gênero: “Petralhas e Coxinhas” x Sociedade Diversa e Plural

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Na última semana o Facebook iniciou uma campanha para que seus usuários atestem a veracidade das fontes daquilo que compartilham. Em uma sociedade polarizada como a nossa, em que tudo se resume a dois lados, multiplicam-se matérias ideologicamente informadas e sem quaisquer compromissos com o que de fato acontece. “Petralhas” e “Coxinhas” possuem suas fontes de matérias falsas e estas circulam nas redes sociais livremente. Recentemente vi na página pessoal de um ativista uma matéria que dizia que Dilma Rousseff foi altamente vaiada em Harvard. Eu acompanhei a conferência de Dilma em Harvard em uma transmissão ao vivo no Facebook e, pelo que assisti, aconteceu exatamente o contrário. Dilma foi ovacionada e muito elogiada, seja pela professora que coordenou e debateu a conferência, seja pela audiência que a assistiu. O mesmo ocorreu na Columbia University e sei porque, mais uma vez, também acompanhei sua intervenção pelo Facebook. Na última quinzena a presidenta ministrou a conferência “The Challenges for Democracy in Brazil” em nove universidades na Costa Leste dos Estados Unidos, sempre acompanhada pelo historiador James Green, que sigo na rede social.

Na última semana, em Nova Iorque, além de Dilma Rousseff, representantes da frente popular ministraram conferências. Dentre eles Fernando Haddad e Gilberto Gil. Em tempo real recebemos notícias de suas intervenções nas redes sociais, seja pelas transmissões oficiais das universidades, seja pela facilidade que os aparelhos celulares apresentam hoje para a divulgação do que está acontecendo à nossa volta.

Estiveram na conferência de Fernando Haddad na Columbia University duas antropólogas que também sigo no Facebook, Carmen Rial e Miriam Grossi, ambas da Universidade Federal de Santa Catarina. Miriam Grossi foi minha orientadora de doutorado em cuja tese analisei a agenda anti-homofobia no ministério da educação de Lula no qual Haddad foi um dos ministros responsáveis pela implementação das mais eficazes políticas educacionais de combate ao preconceito contra lésbicas, gays e trans* até hoje vistas na história do Brasil. Carmen Rial postou dois trechos da conferência na rede SoundCloud, que escutei momentos após o ocorrido. No momento do debate Miriam Grossi, umas das mais importantes antropólogas feministas brasileiras, hoje detentora da Cátedra Ruth Cardoso em Nova Iorque, perguntou sobre o papel que as questões de gênero e sexualidade tiveram em sua gestão na prefeitura de São Paulo, particularmente questões de lésbicas, gays e trans*.

Fernando Haddad que, assim como no Ministério da Educação, teve uma gestão focada na diversidade, afirmou que “a cidade tem que promover interação”. Aos ataques que recebe cotidianamente cabe lembrar que o investimento de Haddad nas questões de diversidade não é de hoje e que, desde o início dos anos 2000, afirma que o investimento em diversidade amplia a produtividade, ou seja, é via diversidade que os processos econômicos e sociais podem ser transformados e melhorados. Em Nova Iorque a tese defendida por Haddad nesse momento é que a cidade é um lugar de encontro e que o ruim é quando há intolerância, pois nesse momento limitamos a nossa capacidade coletiva por essa barreira criada pelo preconceito.

Já Dilma Rousseff, no momento do debate, focou na questão da mulher. O debate surgiu a partir de uma pergunta de Carmen Rial, apenas parcialmente respondida, sobre questões de gênero em seu governo. Dilma, que se aproximou do feminismo no momento do impeachment, reconheceu o papel das organizações de mulheres no seu apoio, afirmando o caráter sexista do golpe. Afirmou também que as mulheres foram uma população prioritária no governo do PT, uma vez que algumas políticas as beneficiavam exclusivamente, a saber, o Bolsa Família, cuja titularidade é preferencialmente feminina e a lei das empregadas domésticas, que buscou regularizar milhões de mulheres que até então se encontravam no mercado informal de trabalho.

A tese de Fernando Haddad e Dilma Rousseff, pelo que entendi, é de que nossa sociedade deve ser um lugar de diversidade. Essa tese não é uma proposta puramente “solidária” com os menos favorecidos. É um projeto de nação em que a nossa diversidade social é estruturante das transformações que almejamos em direção a maiores índices de justiça social e cidadania. Para o alcance desses índices a educação tem um lugar central e a democratização da mídia também. Portanto, cabe a nós verificarmos a fonte das notícias que compartilhamos e não acreditarmos no lixo eletrônico que toma nossas redes sociais atualmente. Antes de compartilharmos matérias que dizem que Dilma Rousseff está sendo vaiada, que tal escutarmos o que ela tem a dizer e definirmos nós mesmas a nossa opinião?

Texto: Prof. Dr. Felipe Bruno Martins Fernandes | Professor do Bacharelado em Estudos de Gênero e Diversidade da UFBA e Coordenador do GIRA.

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